Quanto mais vou sabendo, mais de mim tem medo do que está para trás.
Quanto mais vou ouvindo, mais de mim baixa a cabeça em silêncio envergonhado.
Quanto mais vou descobrindo, mais quero afastar-me.
O enredo parece simples, em bom português. Sinto-me um marciano acabado de aterrar neste lugar.
Não sei o que isso diz de mim mas tenho-me recentemente encontrado a sentir prazer em remexer em lixo, a revolver dejetos, a arrumar porcaria, a limpar confusões, em verdadeiras sessões de "masoquismo". E não é que têm sido terapêuticas, que tenho encontrado paz e conforto no meio daquele fedor nauseabundo?
Quanto mais remexo, maior a repulsa, o desejo de afastar, o desgaste e o abandono... como remédio de uma febre persistente e recorrente, mas cujos sintomas enfraquecem, de dia para dia. Curiosa terapêutica, quando naquela javardice vou encontrando as forças que tantas e tantas vezes faltaram.
Não sei mesmo, parece uma adição estranha... sinto-me bem mas culpado e envergonhado. Mas tenha lá de ser, venham todos os males do Mundo em concentrado pois daqui não quero passar. Tenho dificuldades em me carregar, já de si complicado, não preciso de um mundo destrutivo alapado.
A César o que é de César, ouvi uma vez... pois se César hoje tem de mexer na Subúrbia é porque aspira ao Coliseu. Se tem de sofrer nos campos germanos ou da Gália, é porque quer erguer a Coroa de Louros. Se se sente como um "proletari", é porque quer chegar a 1.º Homem de Roma.
Porque nesta vida não há espaço para menos...
(e as referências à Antiga Roma são pura coincidência)
Folga é folga, venha de lá embrulhada como vier.
Entre a corrida relativamente matinal, que hoje não houve paciência, até ao batido de morango no conforto do sofá a ver o que quer que seja na televisão, tem dias que apetece tudo, outros que não apetece nada.
Hoje não é difícil perceber os motivos da minha escolha. De quando em vez também é merecido o dia de papo no ar. Haverá certamente muitos mais em diante e a fazer fé nos relatos do tempo, os próximos serão passados no mesmo espírito, mas rodeado de água e areia, sob efeito de um sol aquecedor.
Sentei-me quando cheguei. De costas para a janela, confortável, frente a frente. Sem ilusão, receoso também, disposto a tirar de dentro os minutos que tinha em carteira. Havia nervosismo e expectativa, rapidamente lançados para trás das costas, rumo a uma janela fechada.
E falei.
Falei como se não fosse preciso respirar, como se as palavras ultrapassassem a velocidade do pensamento, como se saíssem atropelando as seguintes. Estava decidido, iria arrancar de dentro, do fundo, tudo quanto pudesse, sem interrupções e sem ordem. Ia ao fundo e levava tudo comigo. Sem medos. Sem regras.
E sosseguei.
Risquei-te. Sempre, de todo o lado que pude. De todos os ângulos que me podiam surpreender. Tracei uma linha sobre tudo quanto nos ligava. Fui ao ínfimo procurar alternativas.
Estava longe de saber que havia tantos mais ângulos possíveis, tantas mais surpresas negativas na manga. Quanta desilusão carregas, quanta dor. Donde fugiste daquela famosa linha da felicidade que conduzia os teus passos? Uma linha tua, sem dúvida, mas que perdeste a determinado passo.
Não fui bem-sucedido, é certo. Nem nas linhas que risquei nem no pensamento que julgava estruturado. Outras linhas mais fortes se sobrepunham, sobretudo curiosidade e outros remédios, que me colocaram no colo as respostas. As que queria, as que supunha e as que nunca nos meus sonhos mais terríveis imaginei. E bem sei quantos e quantos sonhos tenho carregado em mim, noites dentro. Um choque, não há como negar, perceber a vida em que te deixaste enredar. Em nome de quê? De quem?
Cada um joga os seus dados conforme lhe apetece. A felicidade depende sempre dos números que saem. Daí a beleza do gesto. E não tem como correr mal, bate sempre certo. Mas, infelizmente, os teus não foram lançados, foram jogados fora. E agora, as linhas são tuas, cose-te com o que puderes.
Ontem foi dia de desabafos.
Ou melhor, honestamente, não perdia nada mas sem esperanças de ganhar se realmente tivesse sido assim. Foram, sem direção ou rumo, simplesmente pelo prazer da escrita e aliviar a carga que ameaça fazer transbordar o copo.
E não me posso dar ao luxo de ver o copo verter.
Mas seguiram, uns a horas, outros fora de horas, mas cumpriram o seu rumo.
Não espero efeitos, não foram por isso que eles foram pensados e criados.
Esperava só paz de espírito e essa consegui arrancá-la donde menos esperava. Dói, sem dúvida, mas chegou embrulhada em papel inesperado e com um laço de surpresa.
Não passa, não pode passar.
Chega e sai a diferentes ritmos, conforme estejas mais ou menos atento. Mas não quando te sentes em casa quando não estás, não quando sentes conforto quando não o tens, não quando experencias paz e ela foi-te trazida.
Pois, foi trazida, não a puxaste, por mais que tenhas ido ao seu encontro.
E é assim, em mãos que não sonham ainda, que encontro um propósito e um rumo. Pois há coisas que não devo ignorar em mim, sob pena de me perder e de me deixar de sentir. E isso será a última coca-cola do deserto.
... merda.
Mais um buraco no tempo, mais uma noite mal dormida.
Seguem fáceis os caminhos que tentas desbravar.
Abraço, para quando te vires novamente.
Hoje é um dia de aperto, sem compreender os motivos. Aliás, não os há, seguramente. Nada os despertou, nem sequer os criou, pura e simplesmente nasceram pela manhã. Mas que não me abandona essa sensação, por alguma razão, isso sim.
Há uma espécie de vazio, inexplicável, uma sensação de abandono, como se o momento seguinte estivesse lá longe, distante, quase inacessível. E essa distância torna-o inócuo, indiferente. No entanto, não tenho qualquer noção de que momento é.
Sei que deve haver mil coisas que devia ou podia fazer em momentos assim. Mas nem essas as quero fazer. Vou-me dar ao luxo de ser preguiçoso e esperar que o façam. Depois? Bom, sigo na onda, a ver como estão as marés.
"Se tem tudo para dar errado e só o consegues ver como a coisa mais acertada do mundo: então é amor.
Nenhum amor ganhou uma sondagem.
Nenhum amor te apanha desprevenido."
PCF, dixit
e eis que voltamos ao mesmo. Deve ser efeito do sol magnífico que se levantou hoje. Ou então não há mesmo nada a fazer.
Já não conseguia encontrar no calendário o último dia de folga como o de ontem.
Se o dia amanheceu cinzento, as horas foram ganhando cor e vida, num sustentado crescimento onde houve de tudo e pouco de nada. Bem regado, como mandam as regras do convívio, cortesia do restaurante São Bento dos Loucos (altamente recomendado, fica já o aviso), em Santos.
Misturam-se palavras, sem sequência, que não obedecem ao que se pensa.
Trocam-se momentos, raros, mas surgem, sem ordem ou agenda.
Segue a vida fácil pelos caminhos tortuosos que insistem em apresentar-se.